quinta-feira, 14 de maio de 2015



Stomatopoda, terrores dos recifes e pérolas da evolução




Odontodactylus scyllarus, mostrando a escama lateral, olhos e apêndices raptoriais
O nome stomatopoda talvez seja desconhecido para muitos dos não conhecedores de criaturas marinhas, mas se chamados de lagostas boxeadoras ou camarões boxeadores, fica bem mais fácil saber de que tipo de animais estamos falando. Os crustáceos da ordem Stomatopoda são seres fascinantes habitantes de águas rasas e em sua maioria em regiões onde há recifes tropicais e bancos de areia, bem como nos manguezais ao redor do mundo. Algumas espécies são encontradas também nas águas temperadas do Hemisfério Norte e Sul. Os camarões boxeadores (como serão tratados daqui em diante), são representados por aproximadamente 450 espécies que variam entre 10 centímetros nas menores espécies a até 45 centímetros de comprimento nas maiores e mais perigosas espécies.
São em geral carnívoros e se alimentam de uma ampla variedade de criaturas marinhas e vivem em tocas sob o solo, em buracos entre os corais e esponjas e entre as raízes dos manguezais. Outras espécies preferem as águas mais rasas com menos de um metro de profundidade, onde escavam tocas muito profundas e nelas se abrigam durante a maré vazia. São animais longevos, algumas espécies são conhecidas por viver por mais de 20 anos de idade já observada.


Gonodactylus glabrous, uma espécie originária dos recifes de coral da Indonésia.
Os camarões boxeadores são seres que possuem uma grande variação cromática, podendo ser cinzentos ou marrons e também apresentar verdadeiros arco-íris em seus exoesqueletos, variando entre verde, vermelho, amarelo, laranja, etc.
São seres extremamente comuns nas águas rasas, mas são muito incompreendidos ainda pela ciência, especialmente no que diz respeito ao seu comportamento e capacidades intelectuais que para um crustáceo são bastante altas.





Estas criaturas são conhecidas desde a antiguidade. Os assírios os chamavam de gafanhotos marinhos, já os aborígines australianos os chamavam de matadores de pitu, por seus hábitos alimentares vorazes e pelo fato de pitu ser uma de suas presas favoritas.
Atualmente os nomes camarão louva-a-deus, tamarutaca, rasga dedos ou lagostas assassinas, são bastante utilizados por aficionados e cientistas como nomes alternativos para estas fascinantes criaturas.



Ecologia 

Gonodactylus smithii, o camarão boxeador ocelado em sua toca


Os camarões boxeadores são criaturas em sua grande maioria, ativos durante o dia e se recolhem durante a noite para descansar, embora espécies noturnas também sejam comuns. Vivem em tocas escavadas no solo, ou roubadas de algum outro animal como peixe, ou como de costume, roubada de um outro camarão boxeador.
São seres muito pouco sociáveis, agressivos e frequentemente violentos. Protegem suas moradias mantendo-se alerta na entrada desta, sendo possível avistar somente sua cabeça e antenas para fora de sua casa. Logo após conseguir uma moradia, fazem melhoramentos constantes, escavando galerias e mais galerias que chegam a ser profundas e por entre os corais, recolhendo conchas e fazendo estas de suporte e retirando areia destas tocas por meio de rápidos movimentos com seus vários pares de pleópodes, ou seja, patas adaptadas para a natação.
Eles raramente deixam as tocas, exceto para a mudança ou em algumas pouquíssimas espécies, para caçar. Mas geralmente preferem esperar por suas vítimas virem até ele, e então afastando-se pouco ou nada de sua toca a capturam e matam por meio de golpes ou empalamento as suas vítimas.


Anatomia

O camarão boxeador apresenta uma anatomia comparável aquela dos camarões comuns e lagostas. Sua carapaça cobre grande parte da cabeça e o tórax, agindo como uma grande e poderosa armadura contra golpes de outros camarões boxeadores e contra predadores. 
O abdome apresenta os segmentos corporais, e estas são igualmente protegidos por uma casca dura que ajuda na proteção e para facilitar na locomoção e também auxilia na hora de ataques, pois ele pode enrolar-se como uma bola e ficar em posição frontal para dar um impulso potente com a cauda e atacar o seu inimigo logo após um ataque inesperado. 
Estes segmentos que agem como placas de ferro de um tanque protegem as partes moles e frágeis do camarão, assim como suas patas e apêndices de um eventual segundo ataque.



A cauda, chamada cientificamente de Télson, auxilia na natação e na proteção da toca como se fosse um alçapão, a qual ele utiliza para bloquear a entrada de uma toca contra oponentes.











Mas as mais fascinantes partes da anatomia destes animais são os seguintes...




Apêndices raptoriais ou garras
Os apêndices raptoriais ou garras são estruturas modificadas mais notórias de um camarão boxeador. São as armas letais desses seres e podem ser divididos em duas distintas categorias: Clavas e arpões.
As clavas estão presentes em diversas espécies e são de uma estrutura extremamente resistente capaz de quebrar até mesmo vidros de aquários. Estas clavas possuem também uma ponta como uma lança que podem causar danos severos em animais grandes e matar animais pequenos. Estas estruturas são notáveis na espécie mais famosa de camarão boxeador, o Odontodactylus scyllarus, que apresenta estas estruturas em grande tamanho e respeitável poder de dano. Esta mesma espécie é capaz de desferir golpes potentes e os mais rápidos do mundo animal: Um golpe tem o poder aceleração semelhante ou superior a um tiro de calibre .22, cerca de 720 Km/h e uma força de impacto impressionante: 60 Kg/cm².

Estruturas raptoriais dos camarões boxeadores. A categoria arpão à esquerda e a categoria clava à esquerda.


Os arpões são muito comuns e estão presentes nas maiores espécies, como o Lysiosquillina maculata. Os camarões boxeadores que apresentam arpões os utilizam de duas maneiras: para a captura de presas grandes como se fossem as patas dianteiras de um louva-a-deus, ou por meio de empalamento das vítimas, matando-as quase instantaneamente.

Ocelo

O ocelo é uma mancha chamada em inglês de Meral Spot, localizada nos apêndices raptoriais e servem como um chamariz para presas desavisadas, geralmente moluscos como polvos e pequenas sépias e peixes, e estas serão a última coisa que uma presa verá antes de ser morta por um golpe destes animais.

Escama lateral

A escama lateral é uma estrutura encontrada logo atrás dos olhos e sobre os apêndices raptoriais, são como grandes barbatanas ou flaps que portam manchas ou desenhos característicos e servem como uma boa chave de identificação de espécies. Cada espécie apresenta um padrão diferente.
Acredita-se que estas escamas laterais sirvam como um tipo de comunicação visual entre camarões boxeadores da mesma espécie. O mais fascinante é que são polarizadas e por meio de câmeras especiais, pesquisadores descobriram que eles usam estas escamas como refletores de luz que refletem a luz ambiente para a comunicação, como se fosse um tipo de código luminoso.

Olhos

Talvez sejam as estruturas mais fascinantes destes animais. Os olhos destas criaturas segundo o que foi descoberto em pesquisas que o sistema visual destas criaturas é desconhecido em qualquer outra espécie de animal, sendo superior à nossa visão e à visão de seres igualmente avançados como polvos e lulas.
 

Odontodactylus scyllarus

Utilizando-se de filtros naturais 
especiais, estes seres incríveis podem tem a clara percepção de Luz Circularmente Polarizada, convertendo-a em luz linear. LCP é percebida por nós e por outros animais como uma mancha ou nebulosidade apenas. Estes filtros oculares destes animais funcionam de forma idêntica às lentes de determinados tipos de câmeras, só que com uma vantagem de aproximadamente 400 milhões de anos desde a evolução dos crustáceos atuais.
O mais incrível é que o corpo os machos de camarões boxeadores reflete a LCP de forma que ele utiliza como uma linguagem visual e corporal para as fêmeas e por mais incrível que pareça, estas criaturas se comunicam desta maneira sem serem vistos por predadores com olhos extremamente avançados como as lulas, que podem perceber a luz linear, mas são incapazes de detectar a LCP, sendo assim eles podem se comunicar sem chamar a atenção.
Os olhos destes animais são os mais complexos de todos. Estes lindos e brilhantes olhos possuem dez diferentes pigmentos sensíveis aos diferentes comprimentos de onda luminosa, sendo assim eles podem ver não somente a LCP, mas também ultravioleta e até mesmo infravermelho!


Tais adaptações evolutivas na visão são difíceis de compreender, mas cientistas tem algumas pistas sobre esta incrível capacidade: Algumas presas do camarão boxeador, como o camarão de vidro e o camarão de areia, são extremamente difíceis de ver sob a água, pois seus corpos são translúcidos, mas estes camarões possuem em seu corpo açúcares que refletem a luz polarizada, sendo assim, tornam-se alvos fáceis para os camarões boxeadores. E como se tudo isso não fosse o suficiente, eles podem mover os olhos independentemente um do outro, mais ou menos como fazem os camaleões, tendo um ângulo de visão de praticamente 360°.




Igualmente fascinante é a capacidade de fluorescência destes animais (no que diz respeito quanto a fluorescência, é a capacidade de absorver a cor e emiti-la em forma de outra.) Em 2008 cientistas de uma universidade nos EUA descobriram que um camarão boxeador da espécie Lysiosquillina glabriuscula, que possui vivas manchas amarelas dispostas em padrões sobre a carapaça são capazes de sinalizar umas para as outras mesmo a uma profundidade de 38 metros, onde o amarelo é praticamente azul.

Lysiosquillina glabriuscula


Comportamento e alimentação

No que diz respeito ao comportamento destas feras dos recifes é que são criaturas agressivas e territoriais. Não aceitam invasores ou transeuntes nas imediações de suas tocas, peixes, estrelas do mar, polvos, caranguejos, outros camarões boxeadores... Todos são expulsos das proximidades das tocas violentamente, sendo muitas vezes atacados com golpes ou então investidas destes camarões, que costumam causar menos danos. A reprodução é um caso.
Durante a reprodução, estes animais, geralmente os machos deixam as tocas em busca de fêmeas, tornando-se vulneráveis não somente ao ataque de predadores, mas também correndo o risco de levarem um golpe de uma fêmea agressiva e pouco amistosa, o que geralmente é o caso.
Os machos ao encontrar uma fêmea tentam comunicar-se visualmente, mostrando as cores e as escamas laterais como grandes painéis coloridos. Se ela se impressiona, ele investe contra a toca, mas mesmo assim a fêmea que é maior ainda pode decidir golpeá-lo e matá-lo se ele não for suficientemente cuidadoso. A cópula ocorre e então o macho tem de abandonar a toca imediatamente após o ato, ou será morto e devorado.


A agressividade é notável durante a alimentação. Esses animais ao localizarem as vítimas investem rápido e imobilizam as presas por meio de golpes. Os golpes das clavas dos maiores indivíduos podem rachar as conchas de caracóis e até de caranguejos grandes. Após os golpes, eles arrastam as presas imobilizadas e moribundas para as tocas e lá desmembram suas vítimas e começam a comer imediatamente.
Peixes tem um destino semelhante.

Em aquários é difícil manter estes animais, pois além de serem agressivos com outros animais e destruírem um recife por conta de suas incessantes escavações, podem matar toda a população de um aquário e até mesmo destruírem os vidros dos aquários com seus golpes. Aquários para estes animais devem ser de um vidro especial grosso, para prevenir rachaduras causadas por eventuais ataques.

Fontes - Wikipedia, National Geographic e IUCN

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